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Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

Fuligem

29.08.13 | Alice Barcellos

Fuligem. Ontem o Porto estava cheio dela. Entrou pela janela da nossa sala, agarrou-se às secretárias, às folhas, aos ecrãs dos computadores. Cada bocadinho de fuligem traz nele o resto de um incêndio. Sortudos nós, ainda assim, que na cidade só levamos com a fuligem, com o céu que não é azul nem cinzento, é cor de fumo. Com o ar carregado.

Tristeza é ver quem perde tudo nestes incêndios de verão, (todo o ano a mesma coisa mas este ano tem sido terrível) quem perde até a vida, como os cinco bombeiros que sucumbiram à fúria das chamas.

Cada bocadinho de fuligem traz com ele também o sofrimento e as lágrimas de quem nunca mais vai esquecer o cheiro do fumo e o calor do fogo.

Fotopoema: Desejos insulares

24.08.13 | Alice Barcellos

 

Aquela imagem congelada causava uma impressão de movimento

Como se aquela estrada estivesse à espera que passasse um carro

Aquela ilha, à espera de ser empurrada e deslocar-se como um navio

naquele oceano azul atlântico

E aquele homem, com desejos insulares

Com vontade de saltar naquele navio e seguir viagem

 

Os mortos são sempre inocentes

22.08.13 | Alice Barcellos

São dezenas de corpos dispostos no chão, envoltos em lençóis brancos, olhos fechados, expressões serenas. Muitas crianças. São a geração perdida e destruída pela guerra. Estas já não vão poder ver o seu país em paz, algumas delas nasceram e morreram durante este conflito, que já entrou no terceiro ano. Numa guerra não há vencedores nem derrotados, não há inocentes, nem culpados. Mas ao olhar para estas imagens tão nítidas do último massacre na Síria, penso que os mortos são sempre inocentes.

Hoje, durante a manhã de trabalho, vi muitas fotografias das vítimas de um ataque químico nos arredores de Damasco. Fiquei por ali, deixei-as terem efeito sobre mim e decidi não usá-las no site. Não era preciso. Ontem foram publicadas noutros sites, até naqueles (que se dizem) de referência. Não consigo pensar em mais palavras e frases para explicar como este conflito me revolta (como todos os conflitos me revoltam) e como não se faz nada para parar, atenuar, conter tantas atrocidades. Os media tomam cada vez mais uma postura de abutres, à espera de imagens e notícias como estas para nos brindarem com os horrores de mais uma guerra sem fim à vista.

Aí pelo meio, há muita gente a faturar com as armas vendidas para os dois lados, há muita gente a dar tudo no terreno para tentar ajudar, há muitas histórias por contar. E há os mortos, que já não são mortos, são números, que no fim do conflito vão ser citados vezes sem conta nas notícias.

Os meus azulejos

21.08.13 | Alice Barcellos

Sempre gostei de casas. Antigas ou novas, uma casa é quase sempre alvo do meu olhar. Sempre gostei imaginar as histórias das casas antigas, estas sim, com as suas janelas e portas gastas pelo tempo, jardins e recantos, conseguem provocar a minha curiosidade, serem misteriosas, belas e decadentes ao mesmo tempo. Mesmo que não sejam nada disso aos olhos de outra pessoa.

Desde que comecei a usar o instagram, uma das minhas redes sociais preferidas, tenho fotografado muitas casas, janelas, portas e azulejos, estes últimos, um mundo à parte na história das casas. Ora gastos, quase em cor, desfeitos ou remendados, ora cheios de vida e cores, com padrões clássicos ou geométricos, os azulejos são um tema recorrente nas minhas aventuras fotográficas instantâneas, principalmente no Porto. Estética e tradição, os azulejos são as joias de uma casa, os seus adornos e o seu cartão de visita. Uma técnica milenar que continua a ser uma marca das (nossas) casas portuguesas.

Alguns amigos já me perguntaram, com algum espanto, onde vou eu buscar tantos azulejos. Ao que penso, não vou buscá-los, eles estão lá, agarrados às paredes, à espera de serem vistos e apreciados. Guardam momentos e histórias, são parte indissociável daquela casa e fazem as ruas ficarem mais coloridas. São um património paralelo e uma forma de comunicação entre a arquitetura e as pessoas. Não é difícil dar com eles, basta estar atento às histórias que as casas nos contam quando passamos por elas.