Um selfie vale mais do que...
Quem nunca pegou numa máquina, apontou para a cara e tirou uma foto que atire a primeira pedra – ou o primeiro post... Pois é, tirar um auto-retrato é uma prática que existe desde que a fotografia se entende como tal. Hoje em dia, o reboliço é tanto à volta desta ação que ela já ganhou um novo nome, selfie, que, por sinal, foi eleita a palavra do ano.
Sempre gostei de auto-retratos. Pela relação de proximidade que eles possuem, pelo ato de fotografarmos a nós próprios, pelos brilhantes auto-retratos que me marcaram desde que comecei a gostar e apreciar fotografia. Mas aí vieram os selfies e retiraram este encanto. Em primeiro lugar, não gosto deste termo. Chateia-me o diminutivo. Em segundo lugar, o facto de já não ser algo minimamente pensado ou planeado. É apontar e tirar. É o selfie no espelho do elevador, o selfie na praia, o selfie na Torre Eiffel...
Se antes víamos o mundo através das nossas câmaras fotográficas, agora vemos o mundo através dos selfies, dos nossos e, principalmente, dos outros. De estrelas pop a ilustres desconhecidos, eles estão sempre lá. Nos nossos feeds, nas nossas notícias e nas nossas conversas. O pior é que gostamos disso. Gostamos de ver caras, de sentir este lado pessoal da fotografia. E este lado voyeurista também.
Andava para escrever sobre isso, quando o viral, mas já quase esquecido, selfie de Obama, Cameron e da primeira-ministra da Dinamarca roubou a cena do funeral de Mandela. Uma trivialidade, um momento de descontração eternizado numa fotografia, foi o suficiente para uma polémica instantânea no nosso mundo iconófilo. Mas se pararmos para refletir um pouco sobre esta imagem, chegamos à conclusão que, se calhar, não vale a pena refletir de todo. Foi uma imagem que se esgotou rápido, marcou um momento mas não um tempo. Se ainda afirmamos, perante certas fotografias, que uma imagem vale mais do que mil palavras, arrisco-me a dizer que um selfie vale menos do que mil pensamentos.
