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Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

As cores do inverno de Amesterdão

26.02.21 | Alice Barcellos

Enquanto conduzíamos a partir de Roterdão, a neve caía em flocos pequenos e das janelas do carro só se via branco. Amesterdão recebeu-me assim, fria, com neve acumulada nos bancos das centenas de bicicletas estacionadas em frente à Estação Central. Rapidamente, sentimos a humidade dos canais a regelar-nos os ossos.

Voltamos a ficar geladas, desta vez na alma, enquanto percorríamos a Casa de Anne Frank, daqueles lugares que estava na minha "bucket list", e revisitávamos aquela história tão forte e triste, daquela família, de tantas outras que foram perseguidas, destroçadas e enviadas para os campos de concentração durante a II Guerra Mundial.

Buscamos conforto num café charmoso, numa chávena de chá e uma fatia de bolo. Amesterdão conquista-nos também pelos ambientes acolhedores que encontramos nos cafés. E pelas casinhas, ao mesmo tempo, todas iguais e todas diferentes. Fugimos aos pontos mais turísticos. Perdemo-nos por entre ruas e ruelas, entramos em lojas vintage. Haverá melhor forma de descobrir uma cidade do que a caminhar e a parar para fotografar cada pormenor?

Estava frio, um dia cinzento de fevereiro, mas, ainda assim, consegui encontrar cores no inverno de Amesterdão. Afinal, basta estarmos atentos aos detalhes que nos fazem sorrir.

Ficaram estas fotografias para ajudar a viajar pelas memórias desta viagem realizada em 2017. Vamos?

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O retrato

24.02.21 | Alice Barcellos

"Sente-se aqui, minha filha". A menina sentava-se, tentando ficar quieta para o retrato, o que não era fácil quando se tem dez anos. Do outro lado, a avó, compenetrada, afiava o lápis de ponta macia que escorregava bem no papel. Depois, levantava o lápis no ar, na vertical e na horizontal, como que a medir o rosto da modelo. Ela já havia feito isso com as filhas e o filho, o marido e, agora, eram os netos os escolhidos para ficarem eternizados na precisão dos seus traços.

Alice não compreendia como a avó conseguia transpor tão perfeitamente o desenho do seu rosto para o papel. Os olhos pequenos e brilhantes, as bochechas salientes, os lábios carnudos, o cabelo desalinhado, o pequeno sinal a meio do lado esquerdo da face. Ela queria também aprender a desenhar como a avó, até chegou a fazer algumas das suas aulas de pintura. Esforçou-se, mas não progrediu, encontrou mais alento nas palavras. Afinal, com elas também é possível desenhar belos retratos e pintar quadros cheios de vida. E não há nada melhor do que as palavras para contar as memórias que nos marcam para sempre.

Saudades daquele tempo, avó.

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Texto escrito no âmbito dos Desafios da Abelha. Veja aqui mais textos e desafios.

Imagem: Kelly Sikkema / Unsplash

Era uma vez uma princesa tão gorda que só ocupava espaço

23.02.21 | Alice Barcellos

Ficava sempre aflita quando tinha de usar vestidos de gala. Pedia à criada que apertasse ao máximo o espartilho e ao alfaiate que optasse por cores escuras. Por mais que tentasse disfarçar, olhava-se ao espelho e pensava sempre: és uma princesa gorda que só ocupa espaço. No salão de baile, as outras princesas e damas, elegantes nos seus vestidos garridos, moviam-se com graça e frivolidade. Ela ficava sentada num canto, à espera que a festa acabasse, entediada com esta vida tão banal que lhe tinha calhado.

Ansiava pelo dia seguinte quando envergava a bata simples, fazia uma longa trança nos cabelos e perdia-se nos campos à volta do castelo. Adorava sentir-se integrada na natureza. Sonhava em galgar os muros e fazer-se ao mundo, explorando as selvas exóticas que conhecia através dos livros.

Nos dias quentes de verão, o seu maior prazer era ir tomar banho nua ao rio, às escondidas. Despia-se de tudo e deixava-se flutuar naquelas águas límpidas. De olhos fechados, viajava para os destinos longínquos que nunca iria conhecer. Ali era leve. Ali não ocupava espaço. Ali sentia-se integrada em algo muito maior.

Afinal, não era assim tão gorda, só havia nascido no tempo e espaço errado.

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Texto escrito no âmbito dos Desafios da Abelha. Veja aqui mais textos e desafios.

Imagem: Jordan Heath / Unsplash

Sorrir faz sorrir

22.02.21 | Alice Barcellos

Gostava de te fazer sorrir como quando ligas a rádio e está a tocar a tua música favorita

Como quando estás a pensar numa pessoa e ela liga ou manda uma mensagem

Como quando encontras o teu nome escrito numa loja ou numa parede

Ou quando encontras uma nota de cinco euros esquecida num casaco antigo

Quando um cheiro qualquer te faz lembrar uma memória feliz de infância

Quando descobres um lugar bonito ou te emocionas com as palavras de um livro

Gostava de te fazer sorrir como naqueles dias em que acordas, está sol, sentes que vai correr tudo bem e estás feliz só porque sim

Quando o teu cão te pisca o olho ou quando uma joaninha te pousa nas mãos

Como quando vais dar uma longa caminhada à praia, de pés descalços, e sentes a espuma das ondas a fazer-te carícias nos tornozelos

Sentas-te nas rochas e sentes a brisa do mar, respiras a maresia e agradeces por este momento de paz

Gostava de te ver sorrir assim, sempre

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Imagem: frank mckenna / Unsplash