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Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

Diário de fuga

Na rotina dos sonhos fugimos dos dias

Esperar

20.06.22 | Alice Barcellos

Esperar é um verbo fácil de conjugar

Afinal, passamos a vida toda à espera

Esperamos enquanto vemos o tempo passar

Num aguardo que, por vezes, desespera

Alguém vai dizer: não devias passar a vida assim

Outros dirão que havemos de esperar até ao fim

Esperamos pelo início do verão

E por um amor que nos aqueça o coração

Esperamos por um reencontro prometido

E por uma despedida com hora marcada

Esperamos que a vida faça algum sentido

Mesmo sabendo que não controlamos nada

Esperamos que o sol se ponha e que a tristeza passe

Que a lua cheia ilumine a noite e que a alegria renasça

Esperamos que as andorinhas rasguem o céu

Que os caminhos se encham de flores

Esperamos por dias doces como o mel

E que sejam pequenas as dores

 

A espera mais bonita é aquela que trago na barriga

Enquanto escrevo estes versos, ela mexe-se

Lembrando que esperar é também acreditar na vida

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Poema escrito em janeiro de 2022 para a minha filha Íris

De tia para ‘stora: memórias do meu percurso escolar

07.06.22 | Alice Barcellos

Sempre adorei a escola. A ansiedade do primeiro dia de aulas, o cheiro do material escolar novo, o ritual de encapar os cadernos e os livros, fazer a mochila, vestir o uniforme. Tudo isso cativou-me desde que me lembro e as minhas primeiras memórias da escola moram em Vassouras, a cidade do estado do Rio de Janeiro que fui viver na altura em que comecei a primária.

Aprender nunca foi difícil para mim (ainda bem!) e, assim sendo, ir para as aulas sempre foi algo que me deixava feliz. Não só por estar a aprender coisas novas, mas também pelos amigos e pelas brincadeiras. No Brasil, chamávamos as professoras de “tias”, uma forma carinhosa de tratar, existindo uma sensação de proximidade maior entre alunos e professores. Pelo menos, durante o ensino primário.

Vim para Portugal com 13 anos e ingressei no oitavo ano numa escola na cidade de Espinho. A minha capacidade de ver o lado bom das situações e a minha curiosidade fizeram com que a adaptação fosse mais fácil do que poderia ser. Isso e escrever num diário – hábito que comecei a ter quando mudei de país. Para não falar aqui do total apoio e cumplicidade que recebia da minha mãe, a minha companheira incondicional.

Consegui fazer amigos que estranhavam o meu português com açúcar. Já eu estranhei o distanciamento travado entre alunos e professores – senhor professor, se faz favor. Rapidamente, comecei a falar português com sotaque de Portugal, algo que foi natural para mim. Lembro-me que tive boas notas, surpreendendo uma professora de português que implicava um pouco com a minha forma de falar e escrever. Era uma ‘stora mais velha, exigente e rabugenta, pelo menos, é assim que me lembro da senhora.

Entrar para o secundário, na vertente de humanidades, foi um momento marcante do meu percurso escolar. Foi aí que comecei realmente a pensar no que gostaria de fazer a nível profissional: história, línguas e jornalismo eram as minhas opções.

A curiosidade pelo jornalismo e pelos media surgiu numa disciplina dada por um professor espetacular, António Santos. Nas suas aulas de educação para os media aprendemos sobre o quarto poder, o “watch dog”, sobre como se faziam os jornais e os noticiários. Ficou a vontade de querer saber mais, revelou-se o dom para escrever notícias e, assim, decidi que numa das minhas opções de curso superior estaria o jornalismo.

Do secundário, guardo também o delicioso exercício do pensar nas aulas de filosofia e como foi incrível descortinar, entre outros grandes pensadores, A Origem da Tragédia de Nietzsche.

Foi também neste período que me apaixonei a sério pela literatura portuguesa, que me encantei com os poemas de Cesário Verde, Sophia e Pessoa. Nas aulas da professora Dulce dissecávamos poemas e procurávamos nas suas entranhas as figuras de estilo, o contexto e todas as pistas que o poeta deixava entre versos e estrofes. Eu adorava estas aulas, estes momentos em que toda a turma saboreava as palavras e pensava sobre elas.

Guardo até hoje com carinho um livro que a professora Dulce me ofereceu no último dia de aulas, O Deus das Pequenas Coisas, com uma dedicatória breve, mas bonita.

Felizmente, a vida brindou-me com um percurso escolar pleno, que ajudou a moldar um pouco da pessoa que hoje sou. Já lá vão uns bons anos, mas continuo a guardar memórias de ouro deste período. Sempre que passo pelo portão da secundária Manuel Laranjeira é como se visualizasse num pequeno filme mental estes momentos que me marcaram de uma forma tão positiva. Recordar é mesmo voltar a viver, mas com aquele filtro da nostalgia que só o passado consegue criar.

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Imagem: Unsplash

Texto escrito no âmbito do desafio de escrita 52 semanas de 2022 (tema 22) do blogue busy as a bee on a rainy day. Obrigada, querida Ana, por te lembrares de mim. Vou tentar ser mais regular nestes desafios sempre tão inspiradores.