As tuas palavras
É bom saber que ainda estás tão perto. Quando passeio pela Granja, vejo as casas do teu tempo e imagino como seria quando lá passavas os verões. E quando na praia sou assolada por sentimentos que tão bem descreveste. Guardo memórias do mar que se traduzem em tantos poemas teus. É bom saber que partilhamos a mesma cidade e o mesmo jardim, o teu primeiro palácio, que ainda hoje me encanta e surpreende. É bom ter-te ao meu lado e arrepiar-me de cada vez que leio um poema teu, como ainda hoje de manhã aconteceu com este aqui, escolhido ao acaso do livro “Mar”:
Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.
Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.
Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.
Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exalação afirmativa.
Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre.
Sophia rima com poesia, maresia, fantasia e magia. Sei que voltaste para buscar os instantes que não viveste junto do mar, sei que todos os dias voltas a tocar o coração de alguém com as tuas palavras e sei que estás sempre por perto quando elas são lidas ou ditas. E não existe melhor legado do que este.
Para terminar esta homenagem, deixo aqui um poema meu:
Não quero nada
Não quero nada a não ser o sol
Não quero nada a não ser o mar
O desenho da areia em curvas perfeitas sob a água
A pele queimada a saber a sal
As ondas desfeitas em espuma branca e grãos de areia
As pegadas que ora se afundam, ora desaparecem
As conchinhas e búzios, presentes do mar
Não preciso de muito para me sentir bem
Um chapéu, pouca roupa, espaço aberto, brisa calma
O som do teu sorriso misturado com o cantar das gaivotas
E o desdobrar das ondas
Mergulho no atlântico
Gelado e quase revolto
Submersa nestas águas
Sinto-me pura, sinto-me livre
E quando levanto do mergulho final
Secando-me ao sol
Tenho vontade
De pensar em verso
De tentar poesia
De afiar a rima
De lembrar Sophia