Da importância dos dias
Esta semana tivemos vários dias para celebrar algo ou alguém. Foi o dia do pai, dia da felicidade, dia da poesia, dia da árvore e foi também o início da Primavera.
A celebração destes dias, alguns criados com mais racionalidade e justificação do que outros, sempre me passou um pouco ao lado. Mas agora, com esta montra de vaidades que é o Facebook, é impossível ficar indiferente a estas datas.
No dia do pai, ficamos a conhecer os ilustres desconhecidos pais de grande parte dos nossos amigos faceboquianos. Já no mês passado, em fevereiro, quantos murais não se encheram de declarações de amor e coraçõezinhos no dia dos namorados. E só estamos no início do ano e ainda temos muitos, e cada vez mais, dias especiais para celebrar.
No meio de tantas datas que nos chamam atenção para alguns assuntos ou simplesmente apelam ao consumo, esta semana até calhou bem. Começamos com um dia para nos lembrarmos dos nossos adorados pais ou avôs. Seguimos para a Primavera que por acaso calhou no dia da felicidade, comemorado pela primeira vez este ano. Para terminar, hoje é o dia da poesia (e o dia da árvore também). A mim, basta um dia quente de primavera, com o verde novo a tingir as árvores, e um bonito poema para ser feliz.
"Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma
Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.
Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é."
Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
