Era uma vez uma princesa tão gorda que só ocupava espaço
Ficava sempre aflita quando tinha de usar vestidos de gala. Pedia à criada que apertasse ao máximo o espartilho e ao alfaiate que optasse por cores escuras. Por mais que tentasse disfarçar, olhava-se ao espelho e pensava sempre: és uma princesa gorda que só ocupa espaço. No salão de baile, as outras princesas e damas, elegantes nos seus vestidos garridos, moviam-se com graça e frivolidade. Ela ficava sentada num canto, à espera que a festa acabasse, entediada com esta vida tão banal que lhe tinha calhado.
Ansiava pelo dia seguinte quando envergava a bata simples, fazia uma longa trança nos cabelos e perdia-se nos campos à volta do castelo. Adorava sentir-se integrada na natureza. Sonhava em galgar os muros e fazer-se ao mundo, explorando as selvas exóticas que conhecia através dos livros.
Nos dias quentes de verão, o seu maior prazer era ir tomar banho nua ao rio, às escondidas. Despia-se de tudo e deixava-se flutuar naquelas águas límpidas. De olhos fechados, viajava para os destinos longínquos que nunca iria conhecer. Ali era leve. Ali não ocupava espaço. Ali sentia-se integrada em algo muito maior.
Afinal, não era assim tão gorda, só havia nascido no tempo e espaço errado.
Texto escrito no âmbito dos Desafios da Abelha. Veja aqui mais textos e desafios.
Imagem: Jordan Heath / Unsplash